Flor de Lis

Flor de Lis

Há uns dias atrás, estava eu a pegar na marmita para ir almoçar quando recebo uma mensagem do André Ribeirinho a convidar-me para o acompanhar num almoço. "Mas só podes voltar às 15h", dizia ele. É claro que recusei e fui aquecer o almoço não é? Pois...

A ideia era ir ao restaurante Flor de Lis, no Hotel Epic Sana Lisboa, conhecer a carta de Outono/Inverno. Para quem não conhece - eu não conhecia - o Epic Sana é um dos mais recentes (abriu este ano) hotéis 5 estrelas de Lisboa, fica entre as Amoreiras e o Marquês e tem o impressionante número de 311 quartos.
O restaurante fica um piso acima da entrada principal. Decoração moderna, muito amplo e umas janelas enormes a deixar entrar muita luz natural.

À mesa, junto à janela com o Tejo à vista, começaram por chegar vários tipos de pão e manteigas ("normal", hibiscos e azeitonas). Eu sou um gajo de pão com manteiga, acho que isto já é coisa de família. Por vezes, mesmo quando já estão as mesas cheias de entradas eu primeiro tenho que comer um pedaço de pão com manteiga. E quando é bom, que era o caso, não há maneira melhor de começar uma refeição.

Após um amouse bouche, iniciaram-se as hostilidades com o carpaccio de pato, terrine de foie gras caramelizada e espuma de milho e baunilha. Da mesma forma que sou um gajo de pão com manteiga, não sou um gajo de foie gras e quando vi um cubo tão grande achei que não ia gostar. Pelo menos anteriormente nunca tinha gostado particularmente. Comecei um bocado a medo a meter só um pedacinho de cada vez com muito pato, mas vi que afinal estava enganado. Não é que estava muito bom? Não sei se era por ser caramelizado, da qualidade do foie gras, ou porque quem o fez das outras vezes que comi se devia dedicar à pesca. Só sei que finalmente percebi porque é que tanta a gente gosta tanto disto. E a combinação com o pato e a espuma estava deliciosa.

O prato de peixe era um belo lombo de cherne corado, com ravioli de alcachofra e jus de caldeirada à portuguesa. Peixe delicioso (apenas podia estar ligeiramente menos passado para atingir a perfeição), um ravioli com um agradável e fora do normal sabor e legumes ligeiramente mal cozidos (no bom sentido, estaladiços). A cereja em cima do bolo foi o molho de caldeirada que deu, a contrastar com toda aquela estética glamorosa, um sabor tradicional "tuga" ao prato. Não resisti em despejar mais um pouco, que vinha numa molheira ao lado do prato.

De seguida veio um autêntico orgasmo visual. Não que os outros pratos não tivessem um sentido estético acima do normal, mas este cabrito assado ao alecrim, aipo e pimenta sarawak com legumes biológicos era quase uma obra de arte. A sério, como é que obrigam uma pessoa a ter que  desmanchar um prato destes? Felizmente não era só o aspecto. O cabrito, assado durante 12h, vem envolvido numa massa muito fina (quase a fazer lembrar pele) em formato de paralelepípedo. A "escola" deste prato deverá ser a mesma que os franceses deixaram nas Beiras para fazer as melhores chanfanas. Até um velhinho sem dentes conseguiria mastigar sem a mínima dificuldade. E o sabor? Quando meti a primeira garfada à boca devo ter feito a cara que fez o Anton Ego quando provou o ratatouille feito pelo ratito Rémy. Sim senhor!

A obra de joalharia que viria a seguir, chamava-se cremoso de avelã, pipoca e gelado de amendoim. O sabor fez-nos lembrar Snikers, apesar dos Snikers serem de amendoím. E aqui o gelado é que é de amendoim, pois o cremoso era de avelã. Bem, seja Snikers ou Nuts, o que é certo é que era muito bom e mais uma vez até custou a desmanchar o prato.

Não conhecia o trabalho do chefe Patrick Lefeuvre e fiquei muito bem impressionado. Pelos vistos era sub-chefe executivo do Ritz. Comparando com a vez que lá comi este ano, este menu estava muitos furos acima. Além da qualidade, a sequência dos pratos faziam sentido, e todo o conjunto de sabores nos remetem mesmo para dias mais frescos. Se com casa cheia se mantiver este nível, temos aqui um caso sério na restauração xpto de Lisboa. Neste caso o restaurante estava quase por nossa conta.

No que toca aos vinhos, a carta é bastante interessante a nível de variedade e quantidade de vinhos a copo. Tem muitas coisas pouco óbvias, daquelas que não aparecem nos supermercados, e muita incidência em vinhos de Lisboa e Tejo, o que faz muito sentido e é de saudar. Também não falta uma boa variedade de Champagnes e os mais emblemáticos vinhos portugueses.

Há duas recomendações do escanção, com 2 e 4 vinhos, por €15 e €39 respectivamente, para acompanhar o menu. Neste caso foi o de 4 vinhos: Quinta da Lagoalva Sauvignon Blanc 2012 (amouse e carpaccio), Quinta do Gradil Viognier 2011 (cherne), Quinta da Lagoalva Syrah e Touriga Nacional 2011 (cabrito) e Quinta do Crasto LBV 2006 (sobremesa).
Cá estão os vinhos do Tejo e Lisboa em destaque, alguns que confesso que provavelmente não seriam as minhas escolhas óbvias, mas que resultaram todas bastante bem. Provavelmente melhor do que se fosse eu a escolher.

Onde a porca torce o rabo é nos preços dos vinhos. Eu percebo que um restaurante num hotel de 5 estrelas queira ter um nível de preços que sirva até como filtro. Mas quem se interessa por vinho como nós, que sabemos boa parte dos preços de cor, vai certamente ficar com pouca vontade de beber vinho.
Não faz sentido para mim que, por exemplo, um Quinta do Crasto (que anda perto dos €10 nas garrafeiras) esteja ao mesmo preço que um menu de degustação com este nível (€50). Não me faria confusão de qualquer espécie pagar €75 por este menu de degustação e €25 por um Quinta do Crasto e seriam os mesmos €100.
E o mais estranho é que nos vinhos de topo isso não acontece. Por exemplo o Barca Velha 2004, que na Garrafeira Nacional (o site que eu costumo usar como referência para preços) custa €349, aparece nesta carta por €300!
A melhor opção acaba por ser mesmo os suplementos de vinhos.

Quanto ao serviço, muito competente, com boa explicação dos pratos, dos vinhos e dos motivos da escolha dos mesmos para o acompanhamento de cada prato. Falta também aqui o teste de casa cheia, para ver como se aguentam sob pressão. Em jeito de conclusão, é sem dúvida um restaurante a revisitar. Para o sítio e o nível de cozinha (qualidade, apresentação e mesmo quantidade) os €50 são mais do que justificados. Mesmo que se saia dos pratos do menu, o preço médio andará pelos €60. É pena de facto o preço dos vinhos, mas pode ser que quando lá voltar tenha motivo e companhia que justifiquem pedir o Barca Velha 2004 e assim vai custar mais na carteira mas menos na alma.

Também fiquei bastante curioso em relação ao Brunch servido aos Sábados entre as 11h e as 16h. Quem for para o mais caro se calhar precisa mesmo de estar lá as 5h a comer.

Morada: Av. Eng. Duarte Pacheco, 15
1070-100 Lisboa
GPS: 38.724561,-9.158524
Telefone: (+351) 211597300 
Email: [email protected]
Facebook: https://www.facebook.com/EPICSANALisboaHotel
Web: http://www.lisboa.epic.sanahotels.com/pt/restaurantes-bares/flor-de-lis/
Horário: Aberto todos os dias das 07h00 às 10h30 (nos fins-de-semana o horário estende-se até às 11h00), das 12h30 às 15h00 e das 19h00 às 23h00