- É um wine bar?
- É uma galeria de arte?
- É uma biblioteca?
- É o Vestigius!
Na verdade é um pouco disto tudo e mais algumas coisas ainda.
Confesso que, até lá ir, sempre fiquei meio baralhado com o conceito da coisa. Cheguei a ter mesmo alguns calafrios quando vi serem anunciados concertos. Não que tenha alguma coisa contra música ao vivo, mas porque quando se misturam tantas coisas numa só, o risco de resvalar para o azeite é elevadíssimo.
Felizmente, logo na primeira visita fiquei aliviado. Não por causa das casas de banho, onde é obrigatório ir nem que seja só para ver, mas porque todos os receios desapareceram num instante.
O Vestigius fica num armazém portuário no Cais do Sodré, mesmo junto à estação, que passou vários anos ao abandono até ser recuperado pelos actuais proprietários. E que bela recuperação, digo eu. Reciclar foi a palavra de ordem e, por todo o lado, encontramos vestigios de coisas encontradas no armazém e da relação do mesmo com o rio. Como o barco que faz de mesa na esplanada, as facturas nos tampos das mesas ou - a peça de que mais se fala - o enorme lustre feito com cordame. As paredes servem também de galeria de arte, onde se expõem temporariamente obras de artistas mais e menos conhecidos. Antes que pensem que isto se transformou num blog de decoração vou já terminar, mas tenho que fazer referência às prateleiras de livros suspensas. Apesar do seu aspecto vintage, baixam-se com um comando, e podemos lá encontrar algumas raridades em que até temos que usar luvas para os folhear.
Pronto, pronto, já está. Vamos lá falar do vinho, que foi o que nos levou lá. Uma das vertentes deste espaço é a da Wine Bar, ou bar de vinhos para nos deixarmos de estrangeirices e ir mais de encontro à lusofonia que aqui se promove. A responsabilidade da carta e serviço de vinhos é (era) do escanção João Chambel que, além de conhecermos há algum tempo, partilha connosco o gosto por vinhos antigos (especialmente da Bairrada). Logo isto é meio caminho andado para subjectividade de avaliação, até porque muito do que está na carta vai de encontro ao meu gosto. E quando nos recebeu começando por sugerir um branco de 1995 da Fundação Eugénio de Almeida, estamos conversados.
A carta de vinhos normal - chamemos-lhe assim - tem cerca de 60 vinhos e é dividida em brancos, tintos, rosés, espumantes (entre eles alguns Champagne) e fortificados/colheitas tardias. A nível de regiões não se centra no costumeiro Douro e Alentejo, sendo bastante abrangente, pena que a que esteja actualmente
online não tenha nenhum tinto da Bairrada. Então João, estás-me a falhar... ;)
No entanto, confirmei que não está actualizada. A rotação é regular e há ainda os vinhos da quinzena, branco e tinto.
Há cerca de 45 vinhos a copo onde não faltam os fortificados, incluindo Madeiras e Bastardinho de Azeitão! Os preços são perfeitamente ajustados tendo em conta os copos, serviço e temperaturas irrepreensíveis.
Depois há a carta da garrafeira existente na cave, que outrora foi a salgadeira do armazém, acessível através de um alçapão. Esta cave é uma verdadeira tentação. Desde mini-verticais de alguns vinhos de topo portugueses a relíquias com largas dezenas de anos, o difícil mesmo é escolher. E aqui sim, há Bairrada! Outra boa notícia (ou má, se estivermos a pensar na carteira) é que há algumas coisas a preços verdadeiramente perigosos, é fácil perder a cabeça.
Para acompanhar os líquidos, há uma pequena carta com algumas coisas para trincar. Entre ostras, queijos, enchidos e, por exemplo, mini-pizzas (que na verdade não são assim tão mini), temos como aconchegar o estômago. Os preços não propriamente acessíveis, mas a qualidade dos ingredientes usados (todos portugueses à excepção da farinha das pizzas) não permite outra coisa. Optámos por uma pizza de chanfana e uma com presunto de vaca (do Joaquim Arnaud) que lembrava bresaola. Ambas belíssimas, especialmente a de chanfana. Ainda houve espaço para a sobremesa, que naquele dia era um bolo de chocolate daqueles tipo mousse, que obviamente pediu um LBV para acompanhar. Pela refeição descrita pagámos cerca de 60€, sendo que 1/3 da conta foi em vinho.
Apesar de dar para almoçar (foi o caso) ou jantar lá, o espaço chama-me mais para ir à tarde ou à noite beber um copo e picar alguma coisa. Até porque a relação da altura das cadeiras com as mesas não é indicada para comer de faca e garfo. Mas estando lá recostado é tão difícil sair...